Pequenas índias no antigo Museu do Índio - foto Roberto Anderson |
Pela exclusividade de notícias
sobre o poder público e pelo constante apoio a lançamentos de projetos e factoides
dos governos, a coluna do Ancelmo Gois, no jornal O Globo, se tornou uma filial
dos Diários Oficiais do Município e do Estado. Nessa coluna foi possível
acompanhar as idas e vindas desses governos na sua conturbada relação com o prédio
do antigo Museu do Índio no Maracanã. Inicialmente o governador o demoliria,
alegando seguir orientações da Fifa. Isto, se viu depois, era falso. Em seguida
o governador afirmou, com todo o seu conhecimento sobre a história urbana da
cidade, que o prédio não tinha qualquer valor. O prefeito foi atrás e, passando
por cima de seu Conselho de Patrimônio, autorizou a demolição. O governador licitou
a empresa que faria a implosão e colocou sua tropa de choque para expulsar os
índios que lá haviam constituído a Aldeia Maracanã.
No entanto, a reação da sociedade
foi fortíssima e crescente. Não só os jovens que acorreram na primeira hora,
mas também artistas e políticos passaram a apoiar a permanência da edificação e
do projeto de um centro de referência da cultura indígena. Abaixo-assinados
agitaram as redes sociais e o assunto esteve em pauta durante todos esses dias.
Por fim, a Ministra da Cultura fez ver ao Governo do Estado que não haveria
apoio federal para a demolição. Na Coluna do Ancelmo o governador Cabral, que sabe
quando está isolado, anuncia agora que o antigo Museu do Índio não será mais
demolido, e que ele e o prefeito irão restaurá-lo "após a saída dos
invasores". Curiosamente esta notícia vem logo depois da confirmação do empresário
Eike Batista a um jornal paulista do seu interesse em receber o complexo do
Maracanã e ali construir estacionamentos e um shopping.
Ora, se toda essa lindíssima luta
pela preservação surgiu exatamente da insistência dos índios de diversas etnias
em lutar contra o desaparecimento de uma edificação que representava algo
importante para sua memória coletiva, como é possível separar a preservação do
prédio de uma finalidade ligada à questão indígena? A edificação que para o
governador não tinha qualquer valor, e que para muitos apressados estava
em ruínas, agora teria outro valor esvaziado de seu conteúdo imaterial? Ou o senhor
Eike teria conseguido comprovar ter sangue indígena?
Há aí uma esperteza do governo,
já que muitas pessoas que são contra a demolição do prédio não têm uma opinião
favorável à presença dos índios naquele local. Mas imaginar o antigo Museu do Índio
apartado da questão indígena é como imaginar a Fundição Progresso sem Perfeito
Fortuna.(1) É jogar ao mar quem verdadeiramente lutou por sua preservação. É
perder uma excelente oportunidade oferecida à cidade pelos que ocuparam o
prédio de termos um local de troca cultural entre diferentes povos.
Aliás, todas as atividades que já se desenvolvem no antigo Museu do Índio como
parte da resistência à sua demolição, e o apoio e participação de pessoas de
várias origens é o fato cultural mais interessante que se pode observar na
cidade nos últimos tempos. Pena que o Ancelmo não vá lá para conferir.
(1) No governo Chagas Freitas, Perfeito Fortuna e outros artistas subiram na fachada da Fundição Progresso, na Lapa, cuja demolição já havia começado. Só saíram de lá após receberem garantias de que o prédio seria preservado. Depois criaram um dos centros culturais de maior êxito na cidade.
(1) No governo Chagas Freitas, Perfeito Fortuna e outros artistas subiram na fachada da Fundição Progresso, na Lapa, cuja demolição já havia começado. Só saíram de lá após receberem garantias de que o prédio seria preservado. Depois criaram um dos centros culturais de maior êxito na cidade.
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