Foto do Instagram de Madrugada RJ |
Tudo parece normal. Seguimos trabalhando, indo à escola ou à faculdade, cuidando dos filhos e dos mais velhos, fazendo almoços de família e, de vez em quando, encontrando os amigos. Mas a violência paira sobre o Rio de Janeiro e cidades vizinhas.
Segundo o Instituto de Segurança Pública, essa violência vem caindo. Em 2022, os crimes de letalidade violenta no Estado do Rio de Janeiro caíram 5,8% em relação ao ano anterior (apesar de o feminicídio ter subido 30,6% naquele ano). O problema é que esses crimes ainda estão em patamares muito altos, tendo havido 4.485 vítimas em 2022. Da mesma forma, os roubos de rua caíram 6,6%. Mas como ficar tranquilo quando 62.092 pessoas sofreram esse tipo de violência, em 2022, no Estado, número esse que sabemos padecer de subnotificação.
Quase todos os dias, balas chamadas de perdidas, saídas das armas de bandidos e de policiais enlouquecidos por uma guerra sem fim, encontram corpos de crianças, em casa ou na escola, de mulheres em seus afazeres, de homens a caminho do trabalho. Guerra sem possibilidade de sucesso no caso do combate às drogas.
Entre julho de 2016 e novembro de 2022, ou seja, em pouco mais de seis anos, o Instituto Fogo Cruzado contabilizou 1.000 pessoas atingidas por balas perdidas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Neste ano de 2023, entre janeiro e abril, na mesma região, já houve 1.182 tiroteios/disparos de arma de fogo, que atingiram 14 crianças.
Nesta semana, uma triste história. A bala não achou o menino, mas, ao contrário, ele achou uma bala não detonada. Curioso, levou-a para casa e experimentou o que aconteceria caso a aquecesse com um isqueiro. A resposta causou a sua morte. Temos que nos perguntar por que uma bala deve estar solta por aí, podendo destroçar a curiosidade de uma criança?
Essa violência não é uniforme na cidade. Buscando medir a violência nos bairros da cidade do Rio de Janeiro, a imobiliária Loft utilizou as categorias homicídio, roubo, furto e total de ocorrências levantadas pelo Instituto Fogo Cruzado. Por essas categorias, os bairros mais violentos da cidade seriam Bangu, Gericinó, Padre Miguel e Senador Camará, os quais se encontram na Zona Oeste. Enquanto isso, Santa Teresa, Gávea, Jardim Botânico, Lagoa, São Conrado e Vidigal estão entre os bairros menos violentos.
A violência é também tremendamente desuniforme, quando se considera o aspecto racial. Em 2022, 70,4% das vítimas de crimes de letalidade violenta eram pretas ou pardas, enquanto os brancos representaram apenas 20,0% do total. Como as áreas menos atingidas são aquelas de moradia das classes média e alta, e a população branca, historicamente mais privilegiada, sofre menos, há uma certa acomodação com a situação.
Mas a palavra medo está cada vez mais presente no cotidiano das pessoas. Há quem saia de casa e já comece a temer. Um medo que pode parecer exagerado, mas que nasce de uma situação real. Há pessoas que sonham sair da cidade ou do país. E há a maioria, que renuncia a flanar à noite, que não se sente livre para passear apreciando o ar da noite. Se saem, o fazem de ponto a ponto, com um carro de aplicativo ou um táxi no meio.
É vital haver pessoas nas ruas, não só de dia, como de noite. Mas o medo vem mantendo as pessoas fora delas. A cidade morre quando nos acostumamos a isso. Os poderes públicos têm muito a fazer. O governo estadual, responsável pela segurança pública, precisa olhar a metrópole como um todo, e levar a todos padrões de segurança civilizada, respeitosa, não racista e efetiva. A Prefeitura, apesar de não ser responsável pelas forças de segurança, tem muito a fazer também. Se incentivar a permanência das pessoas nos espaços públicos, através da criação de espaços acolhedores e propícios ao encontro, já ajudará muito.
Artigo publicado em 11 de maio de 2023 no Diário do Rio.
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