Escada de acesso à estação Glória do Metro do Rio |
E ele veio. Não importava que não fosse muito longe. Era o lugar mais limpo da cidade. A todo momento uma funcionária passava o esfregão no chão preto de plurigoma, aquele piso emborrachado com bolinhas, que brilhava de tão limpo. Contagiados, ou intimidados com tanta limpeza e cuidados, os cariocas, sempre anárquicos, eram outros ao entrar no metrô. Nem uma guimba de cigarro era jogada no chão, nem um papel de bala. E havia proibições, como não viajar sem camisa.
As primeiras estações foram projetadas pelos arquitetos Sabino Barroso, Jaime Zettel e José Leal, que haviam sido colaboradores de Oscar Niemeyer. Os materiais eram os mais nobres possíveis: parapeitos e paredes de mármores, painéis de paredes revestidos de vidrotil, uma espécie de pastilha de vidro, de cores variadas, degraus de granito preto. Nada do brutalismo do concreto aparente que caracterizava o metrô de São Paulo. Talvez o metrô do Rio tenha sido o último suspiro da nobreza perdida com a transferência da capital para Brasília.
Depois vieram novas estações, cada uma com uma cara, de acordo com o governo do momento. Escavadas na pedra, em concreto aparente, com pinturas murais de artistas pouco conhecidos, ou painéis de azulejos homenageando a mãe de Jesus, numa total falta de projeto unificador. Com uma jogada de mestre da destruição do planejamento, o ex-governador Cabral criou algo monstruoso, jogando a Linha 2 dentro da Linha 1 e desprezando a projetada ligação do Estácio com a Praça XV. Uma plataforma fantasma, abaixo da plataforma em uso na Estação Carioca e destinada a essa ligação, permanece inutilizada, atestando o desperdício de recursos públicos.
Em 1997, o metrô foi concedido ao consórcio Opportrans, concessão depois assumida pela empresa MetrôRio. Aparentemente, um dos maiores propósitos era auferir lucros, sem muita preocupação com a qualidade do serviço. Vieram os envelopamentos dos vagões com propagandas, que dificultam a visibilidade de dentro para fora, e as adesivações de pilares, degraus e de todos os espaços disponíveis. E vieram quiosques em profusão, agora até com pregão de pão de queijo na estação Largo do Machado. As antigas estações, elegantes e bem projetadas, foram transformadas em verdadeiros mafuás.
A nova concessionária, em sua grande sabedoria arquitetônica, julgou que a arquitetura dos colaboradores de Niemeyer não era boa o suficiente. E saiu fazendo as intervenções mais estapafúrdias. Paredes de vidrotil? Tinta branca nelas e painéis que as escondam com faixas de acrílico supercoloridas. Programação visual sóbria? Vieram decalques infantilizantes de sandálias havaianas e sorvetes. Agora, as escadas da estação Glória ganharam uma tinta vermelho-bombeiro. Nesse caso, para fazer a propaganda da ESPM. Uma escola que ensina design sendo agente e cúmplice do desrespeito a um projeto arquitetônico, que tem autoria.
O metrô do Rio virou um lugar confuso, barulhento, sujo e com ar de improvisação provinciana. Os percursos nas estações são dificultados pela imensa quantidade de estandes de venda. A manutenção das estações deixa a desejar, assim como sua limpeza. E o bilhete do metrô não está integrado a outros meios de transporte sem adição de valor. O carioca, ao dar uma volta por São Paulo, não apenas encontra um sistema de metrô infinitamente mais amplo, mas também mais organizado. Até o hábito dos passageiros paulistas de esperar o fim do desembarque dos demais passageiros, para iniciar o próprio embarque, é invejável.
Durante a campanha, o atual governador prometeu expandir o metrô e terminar a estação Gávea, atualmente propositalmente inundada para não colapsar. No entanto, depois de eleito, não voltou a falar no assunto. Seria muito bom que o metrô fosse expandido. Apesar de ser um equipamento estadual, nunca ultrapassou as fronteiras do Município do Rio de Janeiro, nunca adentrou a Baixada, por exemplo. Mas, além de ampliar o sistema, seria também importante ouvir os usuários e respeitar a boa arquitetura das primeiras estações. E que as próximas estações tenham projetos de boa qualidade.
Artigo publicado no Diário do Rio em 06 de abril de 2023.
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