sexta-feira, 25 de abril de 2025

Censo 2022 Rio, para onde vão os que ficam?

O último Censo revelou que, desde 2010, a Cidade do Rio de Janeiro perdeu um total de 110.123 pessoas, ou 1,77% de sua população. Somos agora 6.211.223 habitantes. São diversas as razões para essa queda, entre elas, a redução em 26,5% no número de nascidos vivos no município entre os anos de 2000 e 2020. Além da inédita perda de população da Cidade do Rio de Janeiro, observou-se a continuação do movimento iniciado décadas atrás de transferência de população entre bairros e regiões da cidade. Manteve-se a redução dos moradores das zonas Norte, Sul e Centro, em detrimento de toda a Zona Oeste. Por razões diversas, a população remanescente na cidade se muda para uma zona com pouca tradição urbana e pouca infraestrutura, obrigando o poder público a realizar obras e a construir equipamentos públicos. Enquanto isso, ao contrário do que seria desejável, áreas já com infraestrutura seguem perdendo população.

Ainda segundo o Censo 2022, a perda de população no Rio de Janeiro não foi um processo isolado, já que outras capitais, como Salvador, Natal, Belém, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza também tiveram reduções populacionais. Nas quatro primeiras a redução populacional foi acima de 5% nos últimos 12 anos. Da mesma forma, cidades próximas à capital fluminense tiveram redução de população. São Gonçalo teve uma redução de 10,3%, enquanto a perda de população em Nilópolis foi de 6,8%, em Petrópolis de 5,8%, em Duque de Caxias de 5,5% e em São João de Meriti de 3,9%. Em sentido contrário, houve crescimento populacional em Maricá, que mais que dobrou a sua população (+54,8%), Rio das Ostras, que quase dobrou (+48,1%), além de Nova Friburgo, Macaé, Carapebus, Seropédica, Resende, Porto Real e Parati.

A análise dos dados do Censo de 2022 na Cidade do Rio de Janeiro por bairros, realizada pela Prefeitura, suscita diversos questionamentos e possibilidades de estudos para entender a dinâmica populacional carioca. Entre 2010 e 2022, Jacarepaguá teve um aumento de 66.685 pessoas, o maior crescimento populacional absoluto, equivalente a um aumento de 42,39% de sua população, seguido por Recreio dos Bandeirantes, com aumento de 59.076 habitantes (71,83%), Guaratiba (46.756) e Santa Cruz (31.797). Também cresceram Camorim (137,01%) e Itanhangá (76,93%). Já a Tijuca teve o maior decréscimo populacional absoluto, com uma perda de 21.479 pes­soas (-13.11%). Perderam população também os bairros de Vila Isabel, Penha, Copacabana, Com­plexo do Alemão e Realengo. Uma exceção curiosa na Zona Norte foi o crescimento de 81,38% do Rocha.

Toda essa movimentação populacional no território carioca é um fenômeno de grandes proporções, com implicações gigantescas para a dinâmica urbana da cidade. 73% dos bairros cariocas tiveram queda em sua população, enquanto somente aproximadamente 27% dos bairros tiveram aumento populacional. No entanto, esses 27% que tiveram aumento de população representam um território com uma área bem maior do que a área daqueles que perderam população, podendo indicar uma maior dispersão dos moradores, ou seja, uma menor densidade populacional. Por várias razões, mas especialmente do ponto de vista do meio ambiente, esta não seria uma boa notícia.

Perguntas precisam ser feitas pelos pesquisadores sobre esses movimentos de população. O que teria ocorrido na Tijuca e em Vila Isabel que, com respectivamente menos 21.479 e menos 20.228 habitantes, tiveram as maiores quedas populacionais entre os bairros da cidade? Copacabana com uma redução de 17.473 habitantes estaria sendo atingida por uma alta taxa de mortalidade, em razão da sabida concentração de moradores de mais alta idade, ou estaria sendo esvaziada para dar lugar a aluguéis de curto prazo, como o fenômeno Airbnb?

A Área Portuária, objeto de uma Operação Urbana Consorciada, o Porto Maravilha, cuja lei já tem quinze anos, seguiu perdendo população nos 12 anos entre os dois últimos censos. A Saúde perdeu 873 moradores, representando uma perda de 31,76% da sua população. A Gamboa perdeu 1.692 moradores e o Santo Cristo 2.394. É bem provável que no próximo censo esses bairros já mostrem aumento populacional, um reflexo dos tardios empreendimentos habitacionais que lá vêm ocorrendo. Mas, essa perda até aqui registrada denota um imenso fracasso das intenções inicialmente divulgadas. 

Em conjunto, projetos como o Porto Maravilha e o Reviver Centro partem de premissas corretas, ou seja, é preciso incentivar a vinda de novos moradores para essas áreas. Mas, há problemas na execução desses projetos. Como a continuação de perda de população na Área Portuária demonstrou, o projeto Porto Maravilha não privilegiou moradias, não reservou áreas prioritárias para essa função. O resultado é que na primeira década do projeto só foram construídos prédios de escritórios e hotéis. E houve expulsão dos que lá já moravam, um efeito perverso, comprovado pelos números do Censo 2022. Da mesma forma, o projeto Reviver Centro parece privilegiar unidades para locação temporária, o que não tem capacidade de mudar a dinâmica populacional.

Um importante questionamento a ser feito é sobre a dinâmica populacional nas favelas cariocas. Segundo o IPP, entre 2010 e 2022 a área do município do Rio ocupada por favelas cresceu em 1.730.105,25 m2, uma variação de 3,51%. Esse crescimento territorial, relativamente pequeno, não espelha a realidade, já que as favelas estão se verticalizando a olhos vistos. Mas, favelas importantes da Zona Norte parecem ter seguido a tendência de decréscimo populacional daquela região. No Complexo do Alemão a redução foi de impressionantes 14.941 moradores, a quinta maior perda do município. Em Manguinhos foram menos 7.305, na Maré foram menos 4.938 e no Jacarezinho foram menos 2.491. A Mangueira, com aumento de 412 moradores, ficou fora dessa tendência. 

Favelas da Zona Sul, como a Rocinha, a mais populosa do Brasil, e Vidigal tiveram aumento de população com respectivamente mais 1.538 e mais 2.315 moradores. Rio das Pedras está inserida em Jacarepaguá, na Zona Oeste, o bairro que teve o maior aumento popula­cional da cidade. O mais provável é que também tenha tido crescimento de sua população. Já a Cidade de Deus perdeu 5.939 moradores, enquanto a Vila Kennedy perdeu 3.457. A paralisação do projeto Favela Bairro é um dos grandes equívocos da administração municipal, ocorrida ainda na primeira administração do atual prefeito.

A perda de população da Cidade do Rio de Janeiro deve ser vista no quadro de crise das grandes cidades brasileiras, mas também da perda de pujança econômica da cidade. Tal processo, naturalmente, drena energias da cidade. Mas, se como visto, a cidade ainda despende investimentos na sua reconstrução em novos territórios, estabelece-se um padrão de grande ineficiência e de perda de recursos. Recursos esses que seriam valiosos para melhorar as condições de vida da população que ainda aqui permanece. Falta planejamento urbano e vontade política de implementá-lo. Mas, sobram iniciativas pontuais voltadas para agradar um mercado imobiliário imediatista.

Artigo publicado em 24 de abril de 2025 no Diário do Rio.

 

quinta-feira, 17 de abril de 2025

Rio, meu amor

Viver no Rio é perigoso. Você toma um ônibus para o subúrbio e quando ele está no meio da avenida Brasil uns garotos armados e descamisados, com caras de poucos amigos, mandam a carroça parar. Ela vai ser levada para o meio de uma rua, onde outras já estão, para ajudar a bloquear a passagem da polícia. Você não tinha como saber, mas hoje é mais um dia de operação policial no complexo de favelas vizinho à avenida. 

Os tiros comem soltos, todo mundo se agacha junto à mureta que divide as pistas centrais, onde o trânsito é lento, daquelas laterais, onde o trânsito não anda. A TV já está a postos e você pode até ser entrevistado no meio do tiroteio. Melhor ainda, a sua postagem com a gravação da aflição dos outros deitados ao seu lado pode viralizar, ganhar engajamento e multiplicar o seu número de seguidores. 

Viver no Rio é uma delícia. A falta de chuvas nas últimas semanas impediu a chegada de esgoto clandestino às praias e a água está de uma transparência caribenha. Golfinhos foram avistados perto da arrebentação e a temperatura está uma beleza para quem não tem que trabalhar de terno e gravata no centro da cidade. A moçada continua aplaudindo o pôr do sol e sentar na Pedra do Arpoador lhe dá aquele conforto de saber-se um habitante da Cidade Maravilhosa. 

Viver no Rio é estressante porque o ônibus não para no ponto ou, quando para, o faz no meio da rua, obrigando os passageiros a correrem até onde o motorista achou de parar. Dirigir no Rio é uma prova de paciência, porque motoristas param em fila dupla, onde bem entendem, não sinalizam que vão fazer uma conversão à direita ou à esquerda, fazem ultrapassagens que deixam marcas no seu carro e buzinam, buzinam muito. Tudo isso pode ser elevado à enésima potência se estivermos falando de motoristas de motos. Elas proliferaram mais do que uma praga de gafanhotos. 

Viver no Rio é ter alguma amiga que toca tamborim em algum bloco de carnaval e poder receber as dicas dos desfiles mais secretos e geniais daquela festa. É encontrar os amigos de longa data para um chopp no bar da esquina, que estende suas mesas para o meio do asfalto, atrapalhando o trânsito, e onde as pessoas falam animadamente como se vizinhos não houvesse. Tudo isso num dia de semana, mesmo com compromissos seríssimos na manhã do dia seguinte. 

Viver no Rio é ter um prefeito boa praça, que toca na bateria de uma escola de samba e é amigo das damas mais tradicionais do samba. É saber que esse boa praça é muito mais amigo dos investidores do mercado imobiliário, abrindo-lhes as portas do delicioso mundo da desregulamentação. Querem adensar e verticalizar ainda mais a Zona Sul? Pode. Querem legalizar aquilo que a legislação diz que não é permitido? Pagando pode. Querem deixar o Patrimônio se deteriorar até não mais existir ou construir um espigão ao lado de uma igreja tombada? Quer construir um shopping numa praça? Pode, porque o prefeito boa praça botou a pessoa certa para comandar os licenciamentos e liberar geral.

Viver no Rio é viver na expectativa dos shows da Madonna ou da Lady Gaga na praia, que reúnem multidões e fazem milhares de celulares desaparecer. É viver topando com turistas e artistas globais fingindo naturalidade. É pagar um pouco mais caro do que em outras partes do país para qualquer produto ou serviço. Se for um aluguel, pode ir se preparando para pagar os olhos da cara. Mas, com sorte, a sua vista, ou a nesga que você tem dela, é de um cartão postal. 

Viver no Rio é viver em meio ao que sobrou da Corte, da capital federal, da sede do poder e dos negócios, de tudo o que um dia já foi belo e amigável, e se tornou graciosamente decadente e violento. É viver entre sobressaltos e êxtases, entre medos e esperanças, entre um descuido imenso com a cidade e um amor desmesurado por este lugar.

Artigo publicado em 17 de abril de 2025 no Diário do Rio.

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Mata (?) Maravilha, mais um lançamento...

 

O antigo Moinho Fluminense, que era propriedade da Bunge Brasil, foi vendido à empresa Vince Partners em 2014. O Moinho, cujo pó embranquecia as ruas no seu entorno, deixou assim de produzir farinha de trigo, se tornando um ativo imobiliário. Inicialmente, ele seria objeto de um projeto grandioso, englobando os seus diversos edifícios, apresentado como capaz de mudar a dinâmica da Área Portuária. Haveria um shopping, hotel, centro médico e salas comerciais, tudo divulgado por imagens impactantes desse futuro tão incensado. 

Em função desse projeto, em 2017, a empresa contestou na justiça o processo que estava em curso para tombar o antigo Galpão das Artes. Este era constituído por um edifício de fachada eclética voltada para a rua principal e um galpão acoplado, com bela estrutura de ferro. O imóvel havia sido da Prefeitura que, por sua vez, o havia recebido do governo federal. Nessas transações, o coletivo de cenotécnicos que há décadas ocupava o Galpão das Artes foi despejado. Apesar de ter qualidades arquitetônicas que justificavam a sua preservação, o tombamento limitaria o potencial construtivo do terreno, levando a empresa a se insurgir contra tal possibilidade.

Normalmente, quando um processo de tombamento já está iniciado, a justiça, e a Prefeitura, tendem a garantir a existência do objeto do processo de tombamento. Não foi o caso. O galpão foi demolido e desde então há apenas um terreno vazio no seu lugar. Anos depois dessa demolição, o governo estadual chegou a publicar o tombamento do imóvel, então já inexistente...

Em 2019, a Autonomy Investimentos comprou o Moinho Fluminense da Vince Partner e também prometeu dar outro destino ao complexo de edifícios. Mas, nada aconteceu e ele continuou vazio. Vendo que as grandes promessas não se concretizavam, a Prefeitura do Rio de Janeiro chegou a assinar a desapropriação do conjunto para buscar novas parcerias para o local. 

Agora, ficamos sabendo da existência do projeto "Mata Maravilha", saído da iniciativa empreendedora do francês Alexandre Allard, que desenvolveu em São Paulo o complexo Cidade Matarazzo. O projeto para o Rio envolveria o conjunto de imóveis do Moinho Fluminense e vários outros ao redor, cobrindo uma área de 223,4 mil m2. Até mesmo o edifício do 13° Batalhão da Polícia Militar, que é tombado, e galpões do Porto do Rio, ou seja, da alçada de outras instâncias de poder, entraram no projeto. 

A coisa toda é gigantesca, com duas torres de 70 pavimentos, arena para eventos e espaços para empresas e nômades digitais. Estão incluídas também uma marina e um lago artificial, algo como um Piscinão de Ramos de luxo, em área que atualmente ocupada pelo Porto do Rio, ou seja alfandegada. Para tornar tudo mais palatável, as torres são apresentadas como verdes, ou seja, com fachadas tomadas por vegetação e arborização. Haveria o plantio de 50 mil árvores de grande porte, o que representaria uma árvore a cada 5 m2, um evidente exagero. Na verdade, uma impossibilidade. Não vale contabilizar aquelas que seriam plantadas nas varandas das torres projetadas, pois entre os pavimentos somente são possíveis plantas arbustivas, assim mesmo com a exigência de um forte reforço estrutural.

Todo o projeto é coisa de R$ 4,8 bilhões e transformaria a tradicional Praça da Harmonia num local exótico, um lodge amazônico, com plantas saindo de todos os lados e passarelas suspensas entre o verde. A área que um dia foi mar, e depois serviu à atividade portuária e fabril, seria reinventada como um paraíso tropical, pela visão do empreendedor francês. A Prefeitura, que não compreende o valor da história e da paisagem da cidade, entra como parceira desse empreendimento através de uma joint venture.

Alguns meses atrás, a Prefeitura já havia lançado a ideia de construir jardins flutuantes à frente de outros galpões do porto, ao estilo do parque Little Island de Nova Iorque. A mesma Prefeitura, mais recentemente, lançou o projeto de demolir o viaduto que liga o túnel Santa Bárbara à Área Portuária, cujo nome, que homenageia o golpe militar, é bom que seja esquecido. Tal projeto, também de grande impacto, exigiria um mergulhão sob a Estrada de Ferro Central do Brasil e propiciaria a construção de diversos novos imóveis ao longo da nova rua que se formaria, além de uma cópia do Congresso Nacional.

Se acrescentarmos a esses três projetos o do estádio do Flamengo e o do complexo residencial-cultural proposto para o terreno da Estação Leopoldina, veremos que o que não falta à Prefeitura são lançamentos de projetos. Nem sempre eles se concretizam, e muitos são lançados sem essa expectativa. O importante parece ser a existência de imagens em série de possíveis futuros para entreter o público. Um que já ficou para trás foi o das Trump Towers na avenida Francisco Bicalho. O mesmo Trump que agora ameaça o mundo, iria construir um paredão com vários prédios de 50 pavimentos naquela avenida. O tempo dirá se o Mata Maravilha verdejará ou se logo será substituído por uma nova imagem bombástica.

Artigo publicado em 10 de abril de 2025 no Diário do Rio.

 

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Encontro marcado

É outono no hemisfério Sul, o que não muda muita coisa nas temperaturas dos trópicos. Mas, o sol agora já nasce mais tarde e, quando o despertador toca, lá fora ainda está escuro. Acordar uma criança nessas condições se torna tarefa ainda mais difícil. Que mãe, que pai não sente pena de confirmar para o filho que sim, o despertador já tocou? 

Num bairro mais distante, a senhora se levanta sem mesmo precisar que um relógio a desperte. Os anos em que leva acordando cedo já se tornaram parte da sua natureza. Pena que nem em feriados o sono consiga enganar o hábito. As conduções que terá que tomar exigem que a hora de despertar para o trabalho sejam as de qualquer trabalhador dessa cidade. 

A roupa do dia seguinte havia sido deixada dobrada sobre a cadeira, de forma que, quando a criança concordasse em despertar, o tempo de se vestir fosse otimizado. Agora é lavar o rosto, fazer um xixi, pegar as coisas e se sentar junto à mesa da cozinha. O pão com manteiga já está na chapa, o café com muito leite está na caneca e o sanduíche que ele levará na mochila já está quase pronto. 

O gás do botijão acabou e a senhora não teve tempo de comprar outro. Por sorte, tem café solúvel em casa, que é tomado frio mesmo. Pelo menos deu para esquentar o pão de forma com queijo na sanduicheira elétrica. A bolsa com seus objetos de trabalho está sempre na poltrona da sala. Então, é só dar uma última olhada no espelho, se certificar que as janelas estejam fechadas, passar a mão na bolsa e sair para a rua.

Ele se despede ainda sonolento. Não faz muito tempo que ganhou a autonomia para sair de casa desacompanhado. Agora é só descer a ladeira e depois andar alguns quarteirões. Correr com a mochila pesada é um saco, mas também ele não vai ficar molengando, como se fosse um coroa. Na próxima esquina é preciso ficar atento a um sujeito que, de vez em quando, aparece para tentar puxar papo. Na verdade, ele deve querer fazer algum ganho.

O ônibus hoje passou no horário e nem veio tão cheio. Um rapaz, desses que já não existem, lhe cedeu o lugar e ela pode até deixar o pensamento voar durante o trajeto. São tantos anos nesse percurso, mas nunca é a mesma coisa. Se chove, o trânsito para e o temor de se atrasar aumenta. Se faz um belo dia, dá pra ficar observando as outras pessoas que também acordaram cedo para ir ao trabalho. Amigos que caminham juntos ali, um casal que se despede acolá, a cidade entrando no seu modo diurno.

Hoje tudo correu bem e, depois da padaria, ele já conseguiu alcançar seus amigos. É hora de saber se os outros tiveram os mesmos perrengues, de ouvir a reclamação sobre alguma bronca de algum pai, de chutar umas pedras no caminho e de comentar sobre o time de futebol. 

A senhora já saltou do ônibus e agora caminha economizando o valor da segunda passagem. Grupos de crianças vão pelas ruas e alguns senhores passeiam com seus cachorros. O funcionário da padaria lhe dá o bom dia costumeiro antes de lhe perguntar se é o de sempre: pão de queijo para a hora do lanche.

Agora com um grupo maior de amigos, ele chega no seu destino. Ela, um pouco cansada, passa pela portaria e dá bom dia a todos. Ele ainda encontra tempo para jogar com aquela bola murcha esquecida debaixo da escada. Ela cumprimenta os colegas. Ele sobe dois lances de escada, entra na sala e se senta na sua mesa. Ela recupera as energias, abre a porta e dá bom dia. 

As férias de verão acabaram há algumas semanas e ainda está difícil se acostumar com a rotina. Mas, como serão todos os dias de semana dos próximos meses, lá estão os dois, professora e aluno, frente a frente, para mais um dia de aula. Boa sorte a eles.

Artigo publicado em 03 de abril de 2025 no Diário do Rio.