quarta-feira, 13 de julho de 2022

Aqui morrem indigenistas e ambientalistas

Bruno Pereira e Dom Phillips
Seguimos vivendo no país onde se mata ambientalistas, defensores dos direitos humanos, indigenistas e pessoas que lutam pelo direito à terra. De acordo com a Global Witness, em 2020 o Brasil foi o quarto país do mundo em que mais se matou ativistas ambientais. E em 1019 foi o terceiro país do mundo, uma triste liderança. Isso sem falar nos milhares de pessoas negras mortas em consequência do racismo que permeia nossa sociedade e o Estado brasileiro.

Esta é a terra onde foi assassinado o ambientalista Chico Mendes, que lutava pela preservação da floresta na reserva extrativista de Xapuri, no Acre, onde morava. Aqui, entre outros, foram assassinados a religiosa americana Dorothy Mae Stang, o indígena Paulo Paulino Guajajara, e o indigenista Maxciel Pereira dos Santos. Agora mais duas vítimas: o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico, residente no Brasil, Dom Philips, brutalmente assassinados por denunciarem o crime organizado que se instalou na Amazônia.

Como demonstram os fatos, há muito tempo a realidade na Amazônia é dura para quem defende o meio ambiente e os povos indígenas. Mas nos últimos anos isso se agravou muito. Bolsonaro vem atiçando os predadores da Amazônia. Seu governo desvirtuou o Ministério do Meio Ambiente, desestruturou a Funai e o Ibama, dificultou as multas a infratores, fez acordo com madeireiros ilegais, fez vista grossa aos alertas de incêndios e desmatamentos, e precarizou a proteção aos povos indígenas. Os agentes do crime organizado se sentiram fortalecidos e a vida de quem a eles se opõe ficou em risco extremo.

Bolsonaro exonerou o indigenista Bruno Pereira de seu cargo na Funai por ele ter, corretamente, cumprido com o seu dever de proteger os territórios indígenas contra invasões pela mineração ilegal. Sem condições de trabalho, o servidor público se viu forçado a pedir licença e tentar atuar junto a uma organização não governamental, a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari - Unijava. Sem a proteção do Estado brasileiro, sua atuação passou a ser de alto risco. Décadas atrás, indigenistas como os irmãos Villas-Boas eram vistos como heróis nacionais. Atualmente são vistos como um estorvo aos interesses econômicos que querem destruir a Amazônia.  

O assassinato do indigenista Bruno Pereira é uma imensa perda para os povos indígenas e para o Brasil. Bruno buscou conhecer a cultura dos povos isolados, aprendeu línguas que desconhecemos, conquistou com ações a confiança de indígenas traumatizados com a violência que nossa "civilização" a eles impôs. Com sua morte se vai uma ponte que o Brasil decente tentava criar com esses outros seres humanos. Não é simples formar especialistas dedicados à questão indígena. Sem Bruno eles ficam mais vulneráveis à invasão e à destruição de seus territórios por pessoas gananciosas e inescrupulosas.

Dom Philips atuava como jornalista, investigando a situação da Amazônia e as ameaças aos povos indígenas. Sem o trabalho de pessoas como Dom, ficaríamos às escuras, sem informações do que realmente ali acontece. Não é culpa sua o fato de a Amazônia ter se transformado num território tão perigoso para jornalistas, quanto uma zona de guerra. Aliás, o Brasil se tornou um território perigoso para o exercício do jornalismo.

Ainda em choque pela confirmação dos assassinatos de Bruno e Dom, a sociedade brasileira quer saber o que o Estado brasileiro fará para impedir que outros ativistas ambientais sejam mortos na Amazônia. O que o Congresso Nacional tem a dizer? Já não basta de mortes? Há muitos responsáveis pela trágica situação da Amazônia. Mas, em última instância, Bolsonaro tem responsabilidade no assassinato de Bruno Pereira e de Dom Philips. E vindo dele, sabemos que nada será feito para mudar essa situação.

Artigo publicado no Diário do Rio em 16 de junho de 2022


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